Contrails – Abreviatura de “Condensation Trails” (rastos de condensação). São os rastos normalmente formados na traseira dos aviões. Como produto da combustão, forma-se vapor de água que congela a grandes altitudes, onde as temperaturas são negativas, gerando cristais de gelo. O resultado é a formação de nuvens cirrus (1).
Chemtrails – Abreviatura de “Chemical Trails” (rastos químicos). Segundo os Adeptos das Teorias da Conspiração, os chemtrails são criados intencionalmente por pessoas desconhecidas, com objectivo de envenenar a população através de produtos químicos libertados pelos aviões. (2)
II – O que se diz sobre os Chemtrails (2), (3), (4), (5), (6):
Tendo definido e distinguido os contrails dos chemtrails, vamo-nos agora debruçar sobre estes últimos.
O que são: De acordo com os defensores destas ideias, os chemtrails são o resultado de substâncias nocivas libertadas intencionalmente pelos aviões para a atmosfera, formando uma grande quantidade de nuvens que fica nos céus durante imenso tempo, ao contrário dos vulgares contrails. Essas substâncias são identificadas, pelos mesmos proponentes, como alumínio, estrôncio, bário, entre outras.
Onde: Esta ideia surgiu nos Estados Unidos da América e, posteriormente, terá sido disseminada pelo resto do mundo.
Desde quando: a origem da primeira observação dos rastos nebulosos no céu é vaga, mas parece haver observações desde a segunda guerra mundial, período em que os aviões conseguiram atingir elevadas altitudes. (7), (8), (9), (10) O consensual é os rastos terem aumentado em quantidade desde a década de 1990. De acordo com a minha pesquisa, em 1996 começa a surgir a teoria da conspiração de que o governo pretende alterar o clima, com base no estudo “Owning the Weather”, mas só em 1999 começam a surgir referências aos chemtrails.
Quem são os responsáveis: não é bem certo, havendo dedos acusatórios que apontam em diferentes direcções: o governo, as companhias farmacêuticas, os cientistas, os Illumminati, os Bilderberg, os “Donos do Mundo”, (…)
Porquê: Existem duas vertentes independentes: uma ambiental e outra social. Por um lado diz-se que os cientistas e o governo têm uma política deliberada de criar estes rastos no céu para diminuírem o aquecimento global, através da reflexão da luz; ou, em alternativa, porque pretendem controlar o clima, pulverizando as nuvens com reagentes que contribuam para a condensação, criando chuva – a estes processos dá-se o nome de Geoengenharia. Por outro lado, fala-se da existência de responsáveis ocultos que pretendem libertar as substâncias nocivas sobre os campos agrícolas e as pessoas para que estas adoeçam e sejam facilmente manipuláveis.
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Rasto de um contrail no céu (Autoria: João Monteiro)
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III – Análise crítica:
– Alumínio – Assim na Terra, como no Céu:
Durante a guerra do Vietname foram utilizadas várias tácticas para iludir os radares inimigos, sendo uma delas a libertação de reduzidas fibras de alumínio (Chaff, em inglês), que reflectiam o sinal de radar. Se os aviões comerciais estivessem na actualidade a libertar deliberadamente alumínio, estariam a confundir os radares de controlo de tráfego aéreo que os orientam, o que seria impraticável. (11), (12) Análises que têm sido realizadas detectam de facto Alumínio e Bário na água, no gelo e no ar, mas sempre dentro dos níveis padrão. No entanto, estas observações estão dentro do esperado, uma vez que estes elementos ocorrem naturalmente na Natureza. Por exemplo, 7% da crosta terrestre é constituída por Alumínio. (13)
– Mais rastos no céu. Linhas paralelas e cruzadas:
Vêem-se mais rastos no céu, porque aumentou o tráfego aéreo. (14) Os voos a grande altitude na vizinhança dos aeroportos têm trajectos coincidentes. É frequente que aviões diferentes se desloquem numa mesma direcção com um certo intervalo de tempo entre eles. Os aviões da frente deixam um contrail atrás de si, mas quando os próximos passarem pelo mesmo local deixando também um rasto, o contrail anterior já se deslocou com o vento, reproduzindo rastos paralelos. Ocasionalmente, pode haver aviões com rotas perpendiculares a rastos anteriores, dando a sensação que se está a formar uma grelha. (15), (16)
– Estará a população a ser envenenada?
Os contrails são formados naturalmente a uma certa distância da traseira do avião e não logo a seguir aos motores, acabando por formar uma espécie de nuvem persistente. Pelo contrário, se os aviões estivessem a libertar substâncias (líquidas ou em pó), o rasto seria visível mais perto dos motores e a nuvem dissipar-se-ia com a distância, como nos aviões pulverizadores de culturas. (15) Contudo, os agentes biológicos podem ser libertados de um avião e apresentar a forma de um contrail. Mas para isso acontecer, o meio onde estaria o agente biológico, teria de ser aquecido a elevadas temperaturas até ficar no estado gasoso, o que iria matar os agentes nocivos. Mas se, mesmo assim, alguns subsistissem, teriam ainda de sobreviver às temperaturas extremamente baixas do exterior. (15) Ainda para mais, devido ao reduzido tamanho das partículas, estas seriam dispersas e não aterrariam no local onde foram libertadas. Portanto, a probabilidade de haver agentes microbianos ou químicos a serem lançados da troposfera, deliberadamente com o intuito de envenenar a população, é praticamente nula.
– Estarão a controlar o clima?
Geoengenharia é nome dado ao processo de modificação deliberada do ambiente na Terra. Neste sentido têm sido realizadas várias experiências, mas ainda sem resultados definitivos.
Foi em 1996 que surgiu um rumor que associava a libertação de partículas de alumínio dos aviões militares para reflectir a luz solar e assim amenizar a temperatura do planeta. Este rumor baseou-se num estudo académico que saíra nesse ano, “Weather as a force multiplier: Owning the weather in 2025” (1996), e acabou por dar origem, mais tarde, à Teoria da Conspiração dos Chemtrails, o que mereceu um comunicado da Força Aérea a explicitar os factos. (17), (18)
Outro exemplo de modificação do ambiente é o da semeadura de nuvens (cloud seeding), que consiste em libertar reagentes nas nuvens, como o iodeto de prata, que as farão condensar, produzindo chuva. Também neste caso, ainda não há resultados definitivos, pois não se sabe se choveria se não tivessem sido lançados os produtos, não se conseguindo estabelecer ainda uma relação causa-efeito directa. (19)
Em qualquer caso, isto são experiências científicas em que se pretende testar a hipótese de alteração do ambiente, para contornar situações de seca, por exemplo. Daí a pegar nisto e dizer que há conspirações governamentais em prática com a intenção de envenenar as pessoas, vai um grande salto.
– Quem está por detrás dos chemtrails?
Como veremos de seguida, os chemtrails são atribuídos a diversos agentes, de acordo com a variante da teoria que nos é proposta. Há até versões em que os diferentes responsáveis se juntam para conspirar contra a Humanidade. A sensação de conspirações dentro do governo para prejudicar os cidadãos é uma ideia que se encontra frequentemente no pensamento popular norte-americano. Mas porque quereria um governo envenenar os membros da sociedade, fazendo-os ficar doentes?
Segundo os adeptos desta versão, o governo pretende ter cidadãos enfraquecidos para serem facilmente manipulados. A esta ideia juntam-se outras, como a indústria farmacêutica pretender adoecer pessoas para vender mais medicamentos; ou ainda grupos secretos que pretendem eliminar as pessoas mais vulneráveis, preservando as elites e os militares, com o intuito de reduzir a população do planeta. Mas fará isto sentido? A verdade é que estas afirmações não passam de meras especulações, sem qualquer prova apresentada. O que temos assistido nos países ocidentais, principalmente na Europa, é exactamente o contrário: um investimento nos cuidados de saúde e de saneamento, uma aposta na longevidade e na melhoria da qualidade de vida dos cidadãos. Apesar de estarmos próximos de um nível preocupante de sobrepopulação humana no nosso planeta, a solução passa, no meu entender, pelo controlo da natalidade em vez da eliminação de indivíduos. E quando falo em controlo de natalidade, não me refiro a um programa governamental, mas a uma decisão pessoal por parte de cada cidadão, que ocorrerá naturalmente. Com o aumento da qualidade de vida de uma sociedade, aumenta a capacidade de sobrevivência e diminui o número de filhos por casal. O que se verifica em populações do terceiro mundo é que estas famílias têm muitas crianças para compensar as que vão morrendo de várias doenças e de desnutrição. No entanto, ao dar cuidados de saúde a essas famílias, e ao incluí-las no mercado laboral, elas vão ter maior capacidade de cuidar da sua prole, aumentando a sua probabilidade de sobrevivência, tendendo a ter menos filhos, como está relatado no livro “O Fim da Pobreza”, do economista Jeffrey Sachs. (20) Se esta política está a ser aplicada em países do terceiro mundo com o apoio dos países desenvolvidos, porque é que estes países ricos iriam fazer o oposto à sua população?
Ao contrário do que é propagado pelas teorias da conspiração, um governo tem todo o interesse em que os seus cidadãos sejam saudáveis, pois deste modo podem trabalhar e contribuir para a economia nacional. Se a maioria da população adoecesse, acabaria por ser um peso enorme para o próprio Estado que não só teria indivíduos que necessitariam de cuidados de saúde, como não estariam aptos a contribuir para a economia. Ou seja, não só não estariam a gerar riqueza, como ainda trariam custos acrescidos. Aliás, uma estratégia de guerra entre países passa por mutilar os adversários em vez de os matar, pois os países com soldados feridos têm mais encargos, não só porque ficam com operacionais inactivos, como ainda tem de disponibilizar tratamentos e deslocar pessoas para cuidar dos doentes, que doutro modo poderiam ser utilizadas na guerra. Deste modo, porque é que qualquer governo quereria adoecer deliberadamente a população? Além do mais, se houvessem químicos a serem libertados de aviões na troposfera (altitude onde se forma os contrails), eles não cairiam no local de onde foram lançados. Aliás, não haveria qualquer controlo do local onde poderiam assentar, pelo que afectariam indiscriminadamente qualquer indivíduo da sociedade, mesmo os membros do governo, militares, ou seus familiares.
É possível eliminar os chemtrails?
Quando se pensa que a ficção não consegue ir mais longe do que meras especulações sem provas, eis que surgem dois exemplos de como a imaginação humana não pára de nos surpreender:
Alguns adeptos dos chemtrails alegam que os silfos ou sílfides (Sylphs) irão aspirar e transformar os chemtrails em substâncias inofensivas. (6) Ora bem, os silfos são Elementais do Ar, criaturas etéreas mitológicas identificadas pelos gregos. O que é curioso, é que aquilo a que os proponentes desta ideia chamam de silfos, são na realidade nuvens que, com um pouco de imaginação, parecem dragões, gatos, aves, etc. (21) Posto isto, creio que qualquer pessoa sensata sabe responder à pergunta sobre o que é mais provável, as fotografias (22) representarem criaturas mitológicas, ou a imagem de nuvens normais? A este fenómeno de reconhecer padrões familiares em imagens abstractas dá-se o nome de pareidolia. (23), (24)
Outra ideia que está a ser propagada na Internet é que ao borrifar vinagre para o céu, isso fará os chemtrails desaparecerem, como se vê neste filme (25). Alguém deve explicar a essas pessoas que os borrifos de vinagre não vão mais longe que alguns centímetros e a troposfera, onde se formam os contrails, fica a cerca de 8 mil metros de altitude. Como já se explicou, os rastos dos aviões podem durar algumas horas, acabando por desaparecer passado algum tempo, sendo que a sua duração depende das condições atmosféricas.
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Conclusão:
Olhemos para os factos: tudo indica que o os rastos que vemos nos céus após a passagem de aviões são contrails, um fenómeno natural, na sua maioria constituídos por minúsculos cristais de gelo; não há indícios de mais libertações químicas do que aquelas libertadas por um motor; as substâncias, que se dizem ter sido identificadas, como o alumínio, encontram-se espontaneamente na Natureza; o número de contrails no céu aumentou na última década devido ao aumento de voos comerciais; devido às instáveis condições atmosféricas e à altitude, não há controlo do local onde os alegados químicos poderiam cair, afectando qualquer indivíduo indiscriminadamente; a probabilidade de um governo, ou uma entidade secreta, querer adoecer deliberadamente a população é reduzida; até ao momento, não há confirmação científica que apoie a existência de chemtrails (26), (27); o facto de as pessoas desconhecerem os contrails e a sua formação, levou a várias interpretações erradas já no passado. (28)
Assim, com base nos dados disponíveis, concluo que os chemtrails não passam de mais uma teoria da conspiração, como muitas outras que pululam na Internet.
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Notas e Referências:
(1)
Existem vários tipos de nuvens que podem ser distinguidas quanto ao aspecto. As nuvens cirrus são formadas na alta troposfera, a cerca de 8 mil metros de altitude, em temperaturas negativas.
(7)
A primeira descrição científica sobre contrails em inglês parece datar de 1953 (H. Appleman, “The formation of exhaust condensation trails by jet aircraft”, Bulletin of the American Meteorological Society, 34, pp. 14-20), e em alemão de 1941 (E. Schmidt, “Die Entstehung von Eisnebeln aus den Auspuffgasen von Flugmotoren”, Schriften der Deutschen Akademie der Luftfahrtforschung Vol. 44, pp. 1-15). Ver aqui.
(11)
NMSR,
na secção Other metals in the air.
(15)
NMSR,
explicado pelo piloto Ian Wickson.
(20) Jeffrey Sachs, O Fim da Pobreza – como consegui-lo na nossa geração, Casa das Letras, Cruz Quebrada, 2006 – Tradução de Paulo Tiago Bento
http://comcept.org/foco-de-conspiracao/chemtrails/
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