A história da educação no Brasil começa a partir da colonização pelos
portugueses, que viram a necessidade de aculturar os nativos, índios de
várias tribos, a fim de torná-los pessoas com o mínimo de civilidade.
De fato, há notícias de que o primeiro colégio da colônia tenha sido
construído em Salvador pelos jesuítas em 1549. A Companhia de Jesus
era comandada pelo Padre Manoel da Nóbrega, cujas cartas enviadas
ao Padre Simão Rodrigues, em Portugal, constam como preciosas obras
literárias. Elas descrevem o início da História do Brasil. e contribuem
para o estudo dos costumes Tupinambás.
Os colégios jesuítas foram modelo de ensino no Brasil por 210 anos.
Porém, com o Iluminismo, surgiram as ideias de individualismo e uma
nova forma de enxergar a religião. O sujeito passa a ser responsável pelo
seu destino, deixando de lado o pensamento de que Deus governava
todos os acontecimentos. Assim, as cortes passam a se opor aos ensinamentos
dos jesuítas, mesmo porque, começaram a perceber que eles
concentravam grande poder e já não atendiam aos interesses da monarquia.
Os empenhos jesuíticos então são considerados como ameaça a
supremacia monárquica da época. O maior intento dos jesuítas era formar
religiosos e seguidores, tanto que as famílias já tinham o compro1Santo
Inácio de Loiola, fundador da Companhia de Jesus.
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4 Célia Mota
misso de encaminhar um dos filhos para a vida religiosa como afirma
Ribeiro (2003):
A importância social desses religiosos chegou a tal ponto,
que se tornaram a única força capaz de influir no domínio
do senhor de engenho. Isso foi conseguido não só através
dos colégios, como do confessionário, do teatro e, particularmente,
pelo terceiro filho, que deveria seguir a vida religiosa,
sendo que o primeiro seria herdeiro e o segundo
letrado (RIBEIRO. 2003, p. 28).
Tornava-se urgente a retomada de poder da metrópole sobre a colônia
e isso significava expulsar os jesuítas. Os portugueses estavam em
situação de dependência e a economia do país enfrentava dificuldades.
Pois, através do Tratado de Methuen2
(1703), a industrialização de Portugal
é comprometida pela invasão das manufaturas inglesas que canalizavam
para aquele país grande parte das riquezas portuguesas. A capital
lusitana entrava em franca decadência diante de outras potências
europeias e a educação jesuítica não atendia aos interesses comerciais
da coroa. Ao contrário, até atrapalhavam. Foi nesse contexto que surgiu
o Marquês de Pombal (Sebastião José de Carvalho e Melo), com a tarefa
de resolver a situação, ”ou seja, se as escolas da Companhia de Jesus
tinham por objetivo servir aos interesses da fé, Pombal pensou em organizar
a escola para servir aos interesses do Estado” (BELLO, 1998).
Diante desse quadro, o Marquês de Pombal com o seu poder de
ministro do monarca D. José I, expulsa os jesuítas de Portugal e do
Brasil em 1759.
A intenção é recuperar a economia através de uma
concentração do poder real. E também modernizar a cultura portuguesa,
além de tirar o maior proveito possível da colônia (Brasil). Porém, nessa
época a czarina da Rússia, Catarina “A Grande”, vislumbrou preciosa
oportunidade em atrair os jesuítas para seu país, o que acabou sendo
muito positivo para a Cultura Russa. Ela foi visionária ao contrariar
2De acordo com o dicionário de História Portuguesa foi um tratado muito prejudicial
para o país, pois derrubava os preços dos vinhos e outras mercadorias lusitanas,
que entravam na Inglaterra, a um terço do valor dos direitos que era pago a outros
países como a França, por exemplo. Isso colocou o Portugal na dependência industrial
da Inglaterra.
Ensino Público: história de descaso e manipulação política... 5
outros países e notar a importância em acolher esses religiosos. O fato:
conhecimento é poder e o clero sempre teve acesso fácil a ambos.
Enquanto isso, aqui no Brasil, com as reformas Pombalinas instalase
o ensino temporal e o público. Ambos foram elaborados a partir das
“Cartas Régias” e foi assim que a educação sofreu a primeira grande
ruptura no método implantado e solidificado como modelo. A fase que
vem a seguir pode ser descrita como o caos. Nada que pudesse se comparar
ao sistema jesuítico foi implantado e a instrução brasileira se reduziu
a nada. Os professores eram despreparados e mal pagos, além de
serem improvisados.
O período de obscuridade no ensino brasileiro durou até a decisão da
corte portuguesa de se instalar na colônia, em 1808. A partir de então,
D. João VI abriu Academias Militares, Escolas de Direito e Medicina,
a Biblioteca Real, o Jardim Botânico e seu empreendimento mais marcante
em termos de mudança: a Imprensa Régia. Toda essa estrutura foi
criada em prol do bem estar da família real e a corte em sua estadia no
Brasil.
Porém, em 1921 o rei D. João VI volta para Portugal e deixa seu
filho, D Pedro I, como imperador do Brasil. Em 1822, sob pressão de
um elevado número de insatisfeitos com o regime colonial, o príncipe
regente proclama a Independência do Brasil. Mais tarde, em 1824 é
outorgada a primeira Constituição brasileira cujo Art. 179 garantia a
"instrução primária gratuita para todos os cidadãos".
O ano de 1827 foi marcado pela instituição do primeiro método de
ensino do Brasil pós-colonização, o Método Lancaster, ou do "ensino
mútuo". Funcionava da seguinte forma: um aluno treinado, ou mais
adiantado nos estudos, educava um grupo de dez discípulos sob o olhar
vigilante de um inspetor. Tal método foi uma tentativa de suprir a falta
de professores. O quadro abaixo mostra
6 Célia Mota
Ano Ação
1826 Decreto implanta quatro graus de instrução entre eles: escolas
primárias, ou Pedagogias; Liceus; Ginásios e Academias.
1827 Projeto de lei propõe a educação, através de pedagogias, em todas
as cidades e povoados. Também é previsto que se faça o
exame para seleção e nomeação de professores. Além da abertura
de escolas para meninas.
1834 Ato adicional à constituição determina que a responsabilidade
pela administração do ensino primário e secundário passa a ser
das províncias, o que desencadeia o ato de 1835.
1835 Nasce em Niterói a primeira Escola Normal do país. Porém,
os resultados não correspondem às expectativas, a educação
perdeu-se mais uma vez, devido ao tamanho do país, entre outras
coisas.
1837 É criado o Colégio Pedro II, no prédio do antigo colégio de São
Joaquim, na cidade do Rio de Janeiro. A intenção é estabelecer
um modelo pedagógico para o curso secundário. Mas o objetivo
não foi alcançado, pois o colégio não conseguiu se organizar até
o fim do império.
Quadro 1: Ações implantadas no ensino durante a monarquia no Brasil.
Fonte: Maria Isabel Moura Nascimento do site histedbr
Caso tenham sido boas as intenções ao se implantar tais métodos,
os resultados não corresponderam às expectativas. Relatórios do Ministro
do Império Lino Coutinho (1831 a 1836) delataram os resultados
insignificantes da implantação da Lei de 1827. De acordo com artigo
escrito por Nascimento para o site histedBR – Unicamp (1986/2006) o
ensino elementar no país ia de mal a pior. Lino Coutinho argumentava
que os empenhos e dispêndios do Estado para estabelecer e ampliar o
ensino elementar em nada resultou. Ainda acusou os municípios pela
administração ineficiente e precariedade da educação por falta de vistoria.
Os professores são acusados de negligência e os alunos de ociosidade.
Quanto ao poder público, ele admita o abandono do mesmo no
fornecimento dos recursos subsídios como os edifícios públicos previstos
pela lei; livros didáticos e outros itens. Por fim, foram levantadas
questões como o baixo salário dos professores, a complexidade dos
conhecimentos exigidos pela lei – que dificultavam a contratação de
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Ensino Público: história de descaso e manipulação política... 7
profissionais de ensino – além da inconformidade na metodologia adotada
em vista das condições particulares do país. Também nesse período
o ensino no Brasil andava a passos de tartaruga, como demonstra Bello
(2001).
Até a Proclamação da República, em 1889, praticamente
nada se fez de concreto pela educação brasileira. O Imperador
D. Pedro II, quando perguntado que profissão escolheria
não fosse Imperador, afirmou que gostaria de ser
"mestre-escola". Apesar de sua afeição pessoal pela tarefa
educativa, pouco foi feito, em sua gestão, para que se criasse,
no Brasil, um sistema educacional. (BELLO, 2001)
Assim como o imperador D. Pedro II, nos anos que se passaram
vários outros governantes apenas aspiraram melhoras no ensino público
sem que nada de significativo realmente se concretizasse.
Dessa forma,
os apontamentos feitos pelo ministro, já naquele tempo, mostram uma
análise atual se comparada ao quadro da educação contemporânea no
Brasil.
2 Período Republicano
Somente em 1930, na era “Vargas”, surgem reformas educacionais mais
relevantes, como por exemplo, a Lei de Diretrizes e Bases (LDB), que
teve início em 1961, com apoio na Constituição. Esta lei somente foi
atualizada em 1971 e novamente em 1996, vigorando até os dias de hoje
com suas regras anacrônicas.
A educação no País deveria ter se desenvolvido consideravelmente
desde 1549. Porém os resultados das pesquisas vão de encontro aos
artigos da LDB que têm como prioridade garantir “Ensino Fundamental
gratuito, mas obrigatório para todos” (lei 9394196 art.4). De acordo
com o IBGE, no final da década de 1990 apenas duas em cada cinco
pessoas entre 15 e 18 anos tinham completado o Ensino Fundamental
e em 2007 o Brasil teve o segundo maior índice de analfabetismo da
América do Sul.
Os resultados das pesquisas foram abaixo das expectativas. Isso
nos faz pensar nos motivos desse elevado índice de analfabetismo e nos
remete ao principal objetivo em se implantar e fazer valer as referidas
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8 Célia Mota
leis.
Mais especificamente o art. 37, seção V da LDB, relativo ao ensino
para jovens e adultos, se mostrou ineficaz e serviu apenas como dispositivo
no retrocesso dos índices de analfabetismo. Mostrou ser um esquema
para enganar os números e dar aos iletrados a aptidão necessária
ao ato de “votar corretamente”. E assim justificam-se os 30% de analfabetos
funcionais registrados no anuário de 2007 pelo Departamento
Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Dessa
forma, os políticos criaram um “jeitinho” de atingir alguns objetivos
práticos sem comprometer o método educacional vigente. Tal método
visa ensinar a ler e escrever, mas não a pensar e questionar.
Por que insistir nesse processo, visivelmente prejudicial à qualidade
do que é ensinado aos brasileiros? Vários estudos apontam para a ineficácia
e os prejuízos em se avançar o estudante de um nível para outro
nas séries escolares sem o menor critério. Essa técnica objetiva apenas
baixar os números do analfabetismo. Ao que tudo indica, qualidade de
ensino não tem sido preocupação dos governantes. E por que seria?
Eleitores ignorantes são mais fáceis de enganar. A ignorância, ou falta
de conhecimento político, facilita na hora de convencer os eleitores a
vender ou mesmo trocar os votos por promessas que nunca se cumprem.
Santos (2002) confirma:
O que está havendo no Brasil é uma preocupação estatística
da educação. Você é treinado, mas não é educado.
Nada é feito para que você seja igual, porque a pobreza
não é definida só pela renda. É pelo poder, é a posição que
você tem na sociedade. Se você é só treinado, você não
está apto a discutir o seu lugar na sociedade, e esse é o debate
central. A estatística simplifica tudo. As pessoas ficam
felicíssimas com os índices (SANTOS, 2002, p. 168).
O autor concedeu a entrevista acima em 2001.
Os anos se passaram
e suas observações tornam-se mais atuais a cada dia. A educação de
qualidade é acessível somente a quem pode pagar pelo ensino privado
ou abdique de necessidades como lazer e outras para manter as mensalidades
em dia, já que a eficiência do ensino público está inegavelmente
comprometida.
Em A Revolução dos Bichos (ORWELL, 2007, p. 106) existe uma
lei que diz o seguinte: “Todos os bichos são iguais, mas alguns bichos
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Ensino Público: história de descaso e manipulação política... 9
são mais iguais que outros” e isso é tudo que restou de sete mandamentos
feitos pelos bichos na elaboração de um plano de ataque aos humanos,
seus algozes. Com o tempo, alguns porcos foram se mostrando
mais inteligentes e acharam brechas para enganar os companheiros.
Cortes foram feitos nos mandamentos e, dos sete iniciais, restou apenas
o que salienta a diferença entre as igualdades.
Os porcos perceberam
que a inteligência definia a liderança e trataram de reservar conhecimento
e instrução apenas aos seus descendentes e aliados.
Assim, depois de várias alterações, que não foram percebidas devido
à ignorância dos comandados, tanto as palavras quanto o sentido
da última frase no único mandamento, foi alterado. O que inicialmente
confirmava uma igualdade entre eles, agora fortalecia a diferença. E
os porcos, animais que obtinham o conhecimento, aos poucos iam distorcendo
os objetivos da rebelião de modo a se colocarem em posição
privilegiada em relação aos outros. Afirmando sua superioridade pela
inteligência. Nesse contexto, dominaram covardemente toda a granja
explorando a estupidez dos seus “companheiros”.
Com essas informações retomamos a descoberta inicial de que conhecimento
é poder e ambos não são acessíveis ao povo. Desde quando
se descobriu a educação ficou estabelecido que ela fosse reservada a
quem tivesse as melhores condições financeiras. Ou seja, àqueles que
são “mais iguais que os outros”. O tempo passou e o quadro ainda é
o mesmo. Mesmo hoje, as escolas públicas estão longe de atingir um
nível satisfatório no trabalho de alfabetização.
3 Ensino Público Contemporâneo: um histórico de
sacrifícios
As vagas nas universidades federais são ocupadas por uma maioria
(54,3%) de pessoas que recebem mais de cinco salários por mês e que
frequentam as escolas privadas. O fato é que tais instituições oferecem
melhores condições de aprendizagem aos alunos e isso tem se mostrado
motivo de angústia para famílias de baixa renda. Esses provedores se
apertam com as despesas domésticas a fim de tentar igualar as chances
dos filhos na hora de concorrer a uma vaga nas universidades federais.
Para tanto, alguns pais com salários menos favorecidos recorrem às
escolas particulares.
Com a atitude de matricular os filhos em escolas particulares os pais
esperam escapar de um problema herdado do ensino público, que são os
gastos com cursinhos pré-vestibulares. Eles são caros e já se alastraram
como uma doença contagiosa. Aplicam suas técnicas mecanizadas no
treinamento de candidatos que visam passar nas provas padronizadas
das grandes instituições.
Outro motivo de preocupação são as viagens necessárias para os
candidatos que queiram tentar outras universidades e aumentar as chances
de ingressar no ensino superior. Tanto os cursinhos quanto as viagens
são ônus impossível, ou no mínimo sacrificante, para quem não
possui boa remuneração. O fato é que a concorrência por uma vaga nas
Instituições de ensino superior federais é acirrada e os alunos do ensino
particular acabam levando vantagem sobre os que vêm das escolas
públicas.
Algumas iniciativas como as cotas para negros, indígenas e alunos
provenientes de instituições públicas de ensino foram implantadas pelo
governo. Porém, a reserva de cotas, inclusive os 50% para egressos de
escolas públicas, gera polêmica desde 2005 quando a Unicamp (Universidade
de Campinas, SP) afirmou que esse método não leva em conta
a qualificação do estudante. Por isso optou por dar pontos extras para
alunos da escola pública e isso elevou o percentual desses estudantes
entre os aprovados de 28% para 34,1%. “A universidade considera que,
nesse sistema, a qualificação do vestibulando é levada em conta, pois
todos os candidatos disputam as mesmas vagas” (Portal Mec, 2005).
O descaso que não aparece nas estatísticas
O artigo 62 da LDB permite a profissionais que tenham concluído o
curso normal do Ensino Médio alfabetizar crianças na educação infantil
e dos primeiros quatro anos do Ensino Fundamental, como pode ser
visto no site do Palácio do Planalto:
Art. 1o O art. 61 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de
1996, passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 61.
Consideram-se profissionais da educação escolar básica os
que, nela estando em efetivo exercício e tendo sido formados
em cursos reconhecidos, são: I-professores habilitados
em nível médio ou superior para a docência na educação infantil
e nos ensinos fundamental e médio; II trabalhadores
em educação portadores de diploma de pedagogia, com habilitação
em administração, planejamento, supervisão, inspeção
e orientação educacional, bem como com títulos de
mestrado ou doutorado nas mesmas áreas; III trabalhadores
em educação, portadores de diploma de curso técnico ou
superior em área pedagógica ou afim. ( SILVA, agosto de
2009).
Em outubro de 2009 foi aprovado, pela Câmara dos Deputados,
projeto que exige curso superior para professores de educação básica.
Porém, ainda é válido que docentes com nível médio lecionem para
a educação infantil e os primeiros anos do ensino fundamental (1o
ao
5
o
ano). De acordo com matéria publicada no site G1 em outubro de
2009, “Levantamento divulgado pelo Ministério da Educação em maio
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12 Célia Mota
do mesmo ano afirma que quase um terço dos professores não tem curso
superior ou atua em área diferente de sua formação “.
Eis aí uma amostra do desinteresse dos governantes com a qualidade
do ensino público. O curso de pedagogia, que deveria ser prérequisito
para profissionais de educação infantil, ainda é tratado como
algo necessário, mas não indispensável. Qualquer semelhança com a
época da obscuridade do ensino da fase pombalina não é mera coincidência.
O país ainda improvisa profissional nessa área, continua
desvalorizando o trabalho e formação do mesmo. Na maioria das vezes,
os professores são mal remunerados, desestimulados e despreparados
para conduzir salas de aula cada vez mais lotadas, com mais de 40
alunos.
De fato, o que se vê são instituições mal estruturadas e com insuficiência
de profissionais. A estudante do Colégio Manoel Novaes, na
capital baiana, Ivana Silva, afirma que em maio/2009 a escola ficou
parada por mais de uma semana devido à falta de funcionários da área
de limpeza. Eles fizeram greve em protesto pelo atraso de três meses no
pagamento dos salários.
Em junho de 2011 os professores do ensino público em Mato Grosso
entraram em greve, mais uma vez, por melhores pisos salariais e outros
benefícios que lhes são negados.
Os trabalhadores da educação lutam pela implantação imediata
do piso salarial de R$ 1.312,00, mas também pelo
pagamento das horas atividades para professores contratados,
pela posse imediata dos professores aprovados e pelo
avanço na lista dos classificados nos concursos. O movimento
é para garantir que os professores tenham condições
de se dedicar integralmente aos seus alunos, sem precisar
ter dois ou mais empregos. Além disso, é preciso investir
na estrutura das escolas para que educação de qualidade
seja levada à população. (site 24horasnews, 27/06/2011)
Porém, essas não são as únicas dificuldades enfrentadas por quem
depende do ensino público no Brasil. Outro problema grave nessas instituições
está ligado ao fornecimento de merenda. Consta no art. 2o da
lei 11947 (16/06/2009), sobre as diretrizes da alimentação escolar que:
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Ensino Público: história de descaso e manipulação política... 13
A alimentação escolar é direito dos alunos da educação
básica pública e dever do Estado. Será promovida e incentivada
com vistas no atendimento das diretrizes estabelecidas
nesta Lei.
O emprego da alimentação saudável e adequada,
compreendendo o uso de alimentos variados, seguros, que
respeitem a cultura, as tradições e os hábitos alimentares
saudáveis, contribuindo para o crescimento e o desenvolvimento
dos alunos e para a melhoria do rendimento escolar,
em conformidade com a sua faixa etária e seu estado
de saúde, inclusive dos que necessitam de atenção específica;
a inclusão de a educação alimentar e nutricional no
processo de ensino e aprendizagem, que perpassa pelo currículo
escolar, abordando o tema alimentação e nutrição e o
desenvolvimento de práticas saudáveis de vida, na perspectiva
da segurança alimentar e nutricional; a universalidade
do atendimento aos alunos matriculados na rede pública de
educação básica [...]. (SILVA, 16 de junho de 2009).
Ou seja, é direito de todo aluno de escola pública uma alimentação
saudável, variada e nutritiva. Ficando a cargo do Estado o fornecimento
e manutenção desses alimentos. Mas, na contramão dessa lei, o que se
constata em várias escolas é a falta ou desperdício e má conservação
desses suprimentos que, muitas vezes, passam do prazo de validade.
Matéria exibida no Fantástico3
, em 8 de maio de 2011 mostra como
algumas dessas escolas vem oferecendo merenda estragada aos estudantes:
A equipe do Fantástico visitou mais de 50 escolas públicas
– estaduais e municipais – de cinco estados: São Paulo,
Goiás, Rio Grande do Norte, Paraíba e Bahia. Todos sempre
se apresentaram como jornalistas. [...] Em Itaparica,
cidade turística baiana, foram a duas escolas municipais.
Uma funcionária contou que quase não tem merenda e, naquele
momento, só havia açúcar no estoque. Desde o início
do ano, a geladeira da escola está vazia. Só tem água
gelada. [...] Fotos tiradas pelos fiscais da controladoria são
3Programa semanal exibido nas noites de domingo na Rede Globo de Televisão.
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14 Célia Mota
a prova do descaso. Em São Bento do Tocantins, por exemplo,
foi encontrado um sapo ao lado da comida. Em
Branquinha, Alagoas, não havia água potável no colégio e
no armário da merenda, um foco de baratas. [...] Em escola
municipal de Santa Teresinha, na Bahia, a tubulação
de esgoto passa pela cozinha. O charque estava sem data
de validade. Entre os sacos de comida, muitas formigas.
(FANTÁSTICO maio 2011)
É revoltante a forma como o serviço público é tratado nesse país.
As armações política. Em novembro 2011, na Bahia, a Polícia Federal prendeu
sete prefeitos. Entres a acusações, desviar verbas federais
e favorecer uma empresa distribuidora de merenda,
que superfaturava preços e não entregava comida. Entre os
políticos presos, estava o prefeito de Santa Teresinha, Agnaldo
Andrade. Ele ficou dois dias na cadeia e continua no
cargo. [...] Uma das explicações para tantos problemas nas
merendas é a corrupção. O Fantástico teve acesso, com exclusividade,
a dois depoimentos que, segundo o Ministério
Público, ajudam a entender o caminho das fraudes. Genivaldo
Santos é ex-sócio da Verdurama, empresa paulista
do ramo de refeições prontas: “Eu tinha a finalidade de
pagar algumas propinas de alguns municípios. A média
da propina era de 10%”, revela. Esse valor corresponde
a cerca de R$ 70 milhões de propina por ano. O Fantástico
também foi a um sítio. A testemunha do Ministério
Público disse em depoimento e também para a equipe de
reportagem que o sítio está entre os bens comprados pelo
prefeito com dinheiro de propina. Segundo o denunciante,
o valor do sítio foi R$ 250 mil reais, pagos em agosto de
2007. “O pagamento foi feito à vista, de uma vez só, e o
dinheiro foi levado na bolsa. Ele parou o carro ao lado do
meu. Eu coloquei a bolsa dentro do carro dele”, relata a
testemunha. (FANTÁSTICO, maio 2011).
Violência e desrespeito
O cenário da escola pública no Brasil é conhecido e bem divulgado: professores
desestimulados e mal pagos lutam todos os dias com o desinteresse
de alunos marginalizados e, às vezes, violentos. Na verdade,
todo o suporte físico e organizacional das escolas deixa a desejar em
vários sentidos. Péssimas instalações e métodos de ensino ineficazes.
Os professores têm cada vez menos vontade de trabalhar com esse
segmento, pois, além da falta de incentivo do governo – baixos salários
e péssimas condições de trabalho – ainda se deparam com um problema
que tem assustado os profissionais das escolas nos subúrbios: a violência.
O que não falta nos jornais e na Internet é notícia de atos violentos
nas escolas públicas de todo o País. São alunos que ameaçam e agridem
os educadores, funcionários e até mesmo colegas.
Os casos de vandalismo e depredação do patrimônio, além da hostilidade
com os professores, são cada vez mais comuns nas grandes
cidades, tornando ainda mais insustentável a situação do ensino público
no Brasil. Estes agressores praticam as mais variadas formas de tortura
física e psicológica, desde furar os pneus dos carros de diretores
e mestres, até situações mais graves, em que chegam a ser levados aos
hospitais em consequência dos abusos.
4Sistema de avaliações internacionais que julga capacidades em leitura e literatura,
matemática e alfabetização científica. Enfatiza habilidades funcionais adquiridas pelos
estudantes ao final da escolaridade obrigatória. Foi criado em 2000 e é administrado
a cada 3 anos. Cada aplicação avalia os três temas Cada administração incluem
avaliações dos três temas, mas enfoca um deles em profundidade. A administração
mais recente foi em 2009 e focado em leitura. O próximo será em 2012 e vai
enfatizar matemática.
Matéria publicada pelo G1 revela que professores vitimados por
alunos sofrem de stress pós-traumático e são afastados para tratamento.
Joseneide Santos de Aquino relata que três alunas colocaram
acetona e veneno para matar ratos no café da sala dos
professores. "A diretora estava muito assustada e avisou
que uma avó ligou para falar que a neta viu umas meninas
colocando ’chumbinho’ no café dos professores", conta.
(G1 15/05/2011).
Em capitais como Salvador ocorrências como tráfico de drogas e
violências físicas contra alunos e servidores crescem consideravelmente,
por isso alguns membros da população se mobilizam na promoção
de eventos de conscientização. Foi o que aconteceu no mês de junho de
2011 em duas escolas municipais dos bairros do Cabula e São Gonçalo
do Retiro, em parceria com a Polícia Militar. Participaram do debate
pais de alunos, representantes do Ministério Público e estudantes de
várias idades. Entre os participantes há um considerável número de
vítimas, uma das diretoras disse ter sido ameaçada de morte pela mãe
de um aluno.
O assunto é delicado e os estudantes dessas escolas se veem diariamente
ameaçados. As chamadas “balas perdidas” são cada vez mais
frequentes em instituições de ensino público. Em 2010 foram registrados
vários casos por todo o Brasil. Em Fortaleza (CE), uma aluna foi
atingida durante uma apresentação cultural em escola do bairro Bom
Jardim. As pessoas que trabalham na instituição afirmam que não foi a
primeira vez que ocorreu um incidente deste tipo dentro da escola.
No município de Betim (MG), um adolescente de 17 anos é morto
a tiros em escola pública no dia 30 de julho de 2011 enquanto jogava
bola no pátio. Quatro pessoas, entre eles dois menores de idade, 16 e 17
anos, e outro com 19 anos, invadiram a instituição e atiraram contra o
jovem. “A vítima, que levou três tiros na perna e um no tórax, chegou a
ser encaminhada ao hospital, mas não resistiu aos ferimentos. À Folha,
a PM afirmou que o adolescente não tinha passagem pela polícia e que
sua família desconhece os motivos do crime”. (Folha.com, 30/07/2011).
Lastimavelmente o que não faltam são exemplos de ocorrências
traumáticas em escolas públicas em todo o Brasil. Essas situações, assim
como o medo, tornam-se rotineiras na vida dos cidadãos que dewww.bocc.ubi.pt
18 Célia Mota
pendem do ensino público. Mandar o filho para a escola todos os dias é
uma prova de resistência e um desafio.
4 Causa e Consequência
Entre os vários problemas expostos não se pode ignorar a questão da
desigualdade social no Brasil, que cresce no ritmo das metrópoles e
tem uma ligação forte e direta com o sistema público de educação e a
violência generalizada.
O maior medo é sem dúvida, o medo da pobreza e o medo
dos pobres. Isso é grave, porque, acabamos sendo mais
medrosos das vítimas do que das causas da miséria. Sendo
assim, teríamos de nos preparar para viver sob temores ainda
mais vastos e profundos, porque no maravilhoso mundo
novo que agora nos preparam, as grandes cidades no Brasil
serão ainda maiores e mais carregadas de miséria (SANTOS,
2002, p. 126).
Organização Intergovernamental de países industrializados. (Fonte: site IES National
Center for Educations estatistics).
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